segunda-feira, 3 de março de 2014

Coluna Crônica Jornal de Caçapava: A parábola dos cozinheiros da taverna.




(Jornal de Caçapava, 28 de fevereiro de 2014.)

Certa vez, uma jovem, que pretendia ser escritora, perguntou à sua professora predileta como poderia aprender a escrever bem. A professora respondeu que ela, a jovem, teria que dedicar tempo para boas leituras. A jovem ficou amuada, talvez esperando receita. A professora então lhe contou que...

Um taverneiro tinha muitos hóspedes durante o ano todo, pois a cozinha de sua taverna era afamada por toda a região. Era o seu orgulho. Mas o taverneiro, além de orgulhoso, era também ambicioso. Notava, há algum tempo, que seus cozinheiros, tanto quanto trabalhavam, comiam! Cada prato era feito com talento, zelo e dedicação e a mesma energia gasta na produção, era utilizada nas fartas refeições regadas a muito vinho. Como as refeições dos empregados não eram cobradas, achou o taverneiro que poderia ganhar mais se os empregados comessem menos.
Com a inquietação na mente, notou o proprietário que eram cada vez mais frequentes as visitas de três hóspedes misteriosos. Eles, apesar de dormirem na hospedaria da taverna e pagarem pelo pouso, nunca se alimentavam. Rodeavam a mesa farta, enchiam os pratos com todas aquelas guloseimas e iguarias. Sentavam-se e divertiam-se ajeitando os legumes e carnes, perguntavam sobre os ingredientes e feitio, mas não comiam. Partiam deixando o prato lindamente organizado.
Com estadias cada vez mais frequentes foram, os hóspedes misteriosos, a convite do proprietário, conhecerem a cozinha, os utensílios e o trabalho dos cozinheiros. Visivelmente interessados, eles aprenderam o elementar da alquimia culinária e começaram a preparar os pratos oferecidos na taverna. O taverneiro não teve dúvidas, despediu seus cozinheiros e contratou os misteriosos três hóspedes. No início tudo se manteve, o taverneiro teve lucro, pois já sabemos que os três não se alimentavam. Mesquinho, nem este fato incomodou o proprietário que sentia o tilintar das moedas na algibeira.
Mas o tempo passa... Os hóspedes habituais já não se interessavam pela refeição sempre igual, aquela que aprenderam com os antigos e talentosos cozinheiros. E, se algo novo vinha era insosso, não tinha sabor, nem cor que apetecesse. Pensavam, então, como poderiam cozinhar tão mal novas criações, será que não sentiam o sabor? Nós sabemos que não. Com sabores intragáveis, os antigos frequentadores não mais voltavam e os novos não se tornavam antigos.
Como os misteriosos três hóspedes são os escritores que não são leitores.

Sônia Gabriel


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