terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Coluna Crônica: Jornal de Caçapava




A Menina mais bonita do mundo



( Publicada no Jornal de Caçapava de 13 a 19 de novembro de 2009)


Quando tive a notícia que a primeira de meus sobrinhos (ao menos filhos de meus irmãos) tinha nascido lhe desejei, como presente, que fosse forte e decidida, pois este mundo ainda deve muito às mulheres. E como nos contos de fadas quando elas presenteiam, elas o fazem mesmo.
Thais, “a Menina mais bonita do mundo”, é assim mesmo: forte e decidida, mesmo aos cinco anos de idade, e como é interessante observá-la.
Como qualquer ser humano que ama os seus, sei de seus defeitos, mas suas qualidades também gritam.
Thais reinou absoluta ao lado do primo até algum tempo, todas as atenções eram apenas para os dois, daí começaram a chegar os primos menores, literalmente; a família foi crescendo, mas seu espaço tomou rumo inverso. Ela tem lutado para se manter e o faz com muita determinação e charme.
Inventa brincadeiras, propõe diferentes estratégias de diversão, mas os meninos não têm se interessado. Pensa que ela se joga num canto e lamenta? Que nada! Chama quem estiver por perto, insiste, junta os lábios naquele famoso bico vermelho contrastando com a pele alvíssima, de bochechas rosadas, cabelos longos (de tanto ela comer couve) e olhos verdes ou azuis, nunca dá para saber com exatidão. Eu disse, ela é “a Menina mais bonita do mundo”.
Em suas investidas para arrumar alguém para brincar na sua família paterna, tenho exercitado minhas histórias. Já lhe emprestei colar com cristal mágico, ela é muito vaidosa, como toda bailarina, minha pequena Ana Botafogo. Já lhe revelei que a pequena mata próxima de minha casa é repleta de cucas, caiporas, sacis, príncipes e princesas, cavaleiros, fadas e ogros.
Seus olhos brilham, ela escuta e exige silêncio dos meninos.
Mas da última vez foi muito interessante. Semana passada, estávamos numa reunião em minha casa, ela visivelmente contrariada com os meninos. Não a deixavam brincar, os tolinhos. Não tinha brinquedo para ela, eu tinha que dar um jeito, ela determinou. Sentou-se no sofá próximo ao aparador e cruzou os braços. Sentei ao lado, fiz cara de quem estava inventando coisa, estiquei o braço até o aparador e peguei uma chave antiga e um candeeiro, ambos presentes de uma fada. Fiz gesto de silêncio, afinal ali se revelaria um segredo. Aproximei-me dela e falei baixinho: “Pegue a chave assim, com mãos firmes, veja a fechadura no ar, olhe bem, ela está aqui na nossa frente, abra a fechadura, assopre o candeeiro uma única vez, forte. Pronto, a porta se abriu, está vendo? Estão todos ai: fadas, gnomos,animais falantes, reis e rainhas...”.
Seus olhos se arregalaram, ela tomou a chave de minhas mãos e respondeu baixinho: “Estou vendo”. Nisso vieram os meninos correndo, se jogando pelo tapete, se embolando em combates e ela se distraiu e se aborreceu, colocou a chave e o candeeiro no aparador e sentou com bico e tudo no sofá.
Perguntei se queria que eu convidasse a filha da vizinha para brincar com ela, afinal têm quase a mesma idade, ela aceitou, a amiguinha veio trazendo um baú de bonecas e pensei que não dava para concorrer com a Barbie para sempre.
Quando já estava saindo da sala e levando os meninos para outro cômodo para que elas tivessem espaço para brincar, a vi levantar-se ligeira e pegar a chave e o candeeiro e passar para a nova visitante o ritual que eu acabava de lhe ensinar.
Ainda estou salva...
Sônia Gabriel

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