quinta-feira, 18 de agosto de 2011

História de Renato Benvindo Frata



Começamos a postar os textos enviados. E começamos muito bem. Obrigada, Renato! No dia 28 de agosto, conte uma história para alguém e para nós também... 


"Sônia, boa tarde, segue texto para ser lido (e interpretado), no dia da contação de História. Espero que agrade. Beijos e obrigado pela oportunidade.
Renato Benvindo Frata, Academia de Letras e Artes de Paranavaí."

"As Mãos de Jacinto


Cidade onde todos quase se conheciam, Jacinto era alegria no seu jeito simples de ser: sapatão encardido, palheiro por detrás da orelha, camisa desbotada, calça de vários dias, chapéu de palha. Mas de uma simpatia de dar inveja.
“-Jacinto é de boas mãos”, falava meu pai quando se referia ao verdureiro e jardineiro que não se furtava em ajudar a todos. “- É só botar as mãos que a semente germina, a planta cresce, floresce e dá frutos, coisa santa as mãos desse homem...  ... não conheço outro nessas minhas andanças.” E complementava: “- Quando morrer Jacinto, ó” – e batia a palma de uma das mãos nas costas da outra, em sinal de que tudo estaria perdido, porque não haveria outro a lhe tomar o lugar.
Se o vivente precisasse espantar cigarrinhas dos pastos, pulgão das couves, cascavel do roçado e formiga cortadeira do arroz, bastava chamar o velho que com suas rezas espantava a praga intrusa.
Era pá e buff! - No dizer daquele povo.
Nas manhã das terças e sextas, ouvia-se a corneta do verdureiro anunciando frutas e verduras frescas, colhidas na horinha.
Fazia ponto bem próximo de nossa casa, onde a molecada se acotovelava para ganhar banana, laranja, mexerica ou fruta-do-conde, dependendo do tempo das frutas. Mas tinha uma condição. As cascas deverim ser colocadas em uma lata que seria levada à lavoura e servir de adubo.
Jacinto não desperdiçava uma só folha, um só talo. Quando ninguém, especialmente os homens do governo pensavam na preservação do ambiente, na conservação nas nascentes, no trato da poluição, o matuto com sua sabedoria dava lições que não foram aprendidas.
O interessante é que os maços de verduras que vendia vinham enfeixados com fita de folhas de bananeira e sempre acompanhados de uma flor: ou era uma rosa, ou um cravo, ou uma margarida e até flor do campo que ele pacientemente colhia para suas freguesas.
E as presenteva na sua simplicidade.
Às vezes escolhia-se as verduras pela flor que as acompanhava. Mamãe conservava um vaso de louça na mesa da cozinha, sempre pronto para receber as flores de Jacinto.
Acho que as outras mães faziam a mesma coisa, porque era comum ver vasos de flores sobre a mesa da cozinha.
O tempo foi passando, a cidade foi crescendo, nossas vidas se modificando. Os moleques cresceram, aos poucos viraram homens e ganharam o mundo na modernidade que a vida proporcionou.
Outros moleques agora se aboletavam na carroça de Jacinto. E os maços de flores continuaram enfeitados com flores.
A figura de Jacinto, no seu contexto e dentro do seu mundo definhou com o tempo, com suas rezas fortes, hortaliças lindas, frutas açucaradas e flores perfumadas.
Até que numa manhã de inverno a notícia ganhou a cidade: o velho fora encontrado morto no banhado, supõe-se dos males do coração, enquanto colhia agrião.
Tinha ao seu lado uma maço de flores recém cortadas, prontas para serem afixadas à iguaria e entregues às freguezas de sempres.
O vaso de flores, agora vazio da nossa cozinha, foi retirado sem que ninguém dissesse palavra, pois o respeitoso silêncio foi a oração que mamãe dedicou ao verdureiro gentil."



Os textos estão sendo postados de acordo com o enviado pelos autores.
Divirtam-se!

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