(Publicada no Jornal Valeparaibano em 30/10/2008)
Milagre é uma definição subjetiva demais. Muitos vivem a espera de um milagre, alguns afirmam que eles acontecem a todo o momento e uma parcela extremamente considerável defende que eles não existem.
E eu?
Milagre é substantivo masculino e levando-se em conta diferentes dicionários, podemos concluir que o conceito explica aquilo que é raro, um fato maravilhoso onde acontece toda suspensão das leis naturais, um milagre é operado por forças sobrenaturais.
Não é fácil acreditar em milagres, é preciso um esforço muito grande, é necessário abrir mão de convicções enraizadas na razão. É fundamental sentir e acreditar demais e já não temos tanta facilidade em tal proeza.
Se eu acredito em milagres?
Só nos preocupamos com milagres quando nada mais podemos tentar, quando as explicações não se justificam, só vemos os milagres cotidianos quando o tempo não é mais essencial na desenvoltura de nossas vaidades particulares e sociais.
Não há melhor época para pensar em milagres do que na primavera, durante esta estação, eles estão aflorados, os micros milagres do renascer, renovar, do verde cobrindo o cinzento de até então, da luz se propagando até o mais íntimo dos cantos escuros que insistimos em manter. São breves meses para tanta transição, do silêncio vazio para a alegria barulhenta dos bichos e das pessoas felizes, das angústias solitárias, encolhidas em busca de se aquecerem para a confraternização das horas mais lentas com aqueles que nos fazem bem e são brisa refrescante.
E os milagres?
Acordar e ter vontade de abrir a janela, respirar fundo e encher os pulmões de esperança, vê-los dormindo, descansando e saber que não estou só. Caminhar pela casa e sorrir só para mim, sabendo que tudo é possível mesmo que eu não possa nada. Só esperar.
Meu silêncio foi humilde oferta, dízimo para a natureza que quis me presentear. Entender, eu ainda não entendi, não sei explicar. Minha alma e ventre cheios de vida mesmo diante da impossibilidade que me é imposta é um milagre? É o que me dizem quando ficam sabendo.
Eu?
Nada sei, não posso viver a espera de um milagre, mas estou vivendo a cada dia o milagre da espera, como já vivi há dez anos e sou feliz. Acolho meu presente todas as manhãs com um afago e um abraço e a cada dia seu abraço me alcança mais.
Decidi diante desta surpresa da natureza não mais me angustiar com o que não posso decidir. Estou cuidando de meu presente e o amando a cada dia com a confiança do que é eterno. Está no brilho dos meus olhos a evidente felicidade de estar habitada.
Sônia Gabriel