Nesses dias de
retorno às aulas, pergunto aos companheiros da minha geração dos quarentões,
como era quando vocês eram estudantes ou alunos (é, há diferença)? As primeiras
respostas provavelmente serão carregadas
de saudosismo, elas nos chegarão com a névoa do tempo passado, suavizadas por
nossa memória seletiva e celebraremos os sucessos de aprendizagem, nossas
disciplinas prediletas, os bons professores, os colegas mais próximos, os
perfumes da merenda e dos livros novos, a euforia do recreio (interessante como
passou a chamar-se intervalo), a belezura dos uniformes, o chegar das férias, a
ansiedade dos retornos aos bancos escolares a cada novo período letivo.
Ecoarão relatos
de que éramos excelentes alunos, obedientes, disciplinados, respeitávamos
nossos professores e os funcionários da escola, não faltávamos, nosso material
era impecável, prestávamos atenção em todas as aulas, sentávamos todos na parte
da frente da sala (?????), não deixávamos de entregar as tarefas e os trabalhos
solicitados, nossas notas eram excelentes e, mesmo quando a matéria era difícil,
nossa disciplina nos estudos nos faziam alcançar as melhores médias.
A nossa escola era muito diferente desta de
hoje, não havia violência, os alunos aprendiam e quando algum aluno não se
encaixava nesse modelo descrito, era convidado a se retirar da instituição de
ensino. As salas não eram superlotadas,
ninguém ia para a aula sem material e não faltavam em dia de avaliação.
Chego a sonhar
com a invenção da máquina do tempo e voltar para ser professora nessa época, o
problema seria localizar o tempo para a chegada do equipamento, pois essa
escola sem problemas, quase perfeita, nunca existiu. Basta visitar a História
da Educação, a história dos professores e alunos brasileiros. Aparando as
arestas do “nunca existiu”, obviamente muitas dessas referências eram fatos e
outras não, em distintas memórias. A escola das nossas memórias é só nossa, é
afetiva.
Mas a escola in
veritas sempre teve muitas questões e essa afirmação recorrente de que ela foi melhor do que a de agora é discutível,
carece de informações e reflexões profundas como qualquer construção de conhecimento. Não
é tarefa para uma singela crônica.
Pois é, a
crônica! O que me trouxe a estas linhas foi considerar que a escola, em geral,
para muitos alunos, é chata. Ficar ao menos cinco horas por dia em um local
fechado, sentado em cadeiras duras, num entra e sai de professores em que
muitas disciplinas não são do gosto para crianças e adolescentes, pedindo atenção
e concentração quando o celular é bem mais divertido (já foram a rua, o
radinho, o videogame, a televisão...), escutando coisas que não se sabe para
que servem ou tendo que “saber sobre o
tempo em que nem tinha nascido” não é tão simples.
Eu não estou
justificando indisciplinas graves nem violências, antes que a tentação de
tornar rasa essa prosa nos engula. Estou pensando na maioria dos nossos alunos,
no comportamento que observamos no cotidiano escolar, na necessidade constante
de ir ao banheiro que eles desenvolvem da primeira à sexta aula. E, para tentar
entender pensei em mim.
Pois bem, eu
não fui a melhor aluna da sala, não
aprendia tudo num estalo, não fui uma aluna brilhante, não tive apenas notas altas. Era muito
caprichosa e dedicada, isso sim. Adorava ir à escola no primário; sofri no ginásio,
pois tive que trabalhar para ajudar em casa; detestei o colegial e me encontrei
no magistério. Aprender a estudar mesmo foi algo que se concretizou na
faculdade e o encantamento foi tanto que nunca mais parei de fazê-lo.
É como se
entre o despertar do primário e as descobertas do conhecimento na universidade, existisse um abismo que é abrandado
pelas lembranças de poucos professores que solicitam respeito da minha memória;
no entanto, muitos nomes sequer lembro,
não recordo a maioria dos conteúdos. Devido minha aptidão para humanas, as
disciplinas que me marcaram foram Arte e Língua Portuguesa.
Não conseguiria compreender as Ciências
Humanas sem a instrumentalização da Literatura, da escrita e da Arte. É certo,
para mim, que são ferramentas para todos os demais aprendizados escolares. Essas
pérolas suavizam qualquer esforço exigido seja de Humanas, Biológicas ou
Exatas. São saberes que nos humanizam, nos ajudam a caminhar pela dolorosa e
prazerosa descoberta do eu que nos motiva a continuar acreditando no ser humano,
conscientes de que enquanto professores somos eternos estudantes; sem realizar
isso em nossas reflexões fica impossível entrar nas salas de aulas com as demandas
que tem nos exigido.
Nessa volta
aos dias letivos, torço para que as aulas de História (meu lugar de fala) que
eles acham tão chatas possam ser mais agradáveis e que eu consiga ajudá-los a
olhar para nosso passado de forma atenta o que tem sido muito necessário.
Tomara que minha paixão pela história das pessoas, pela nossa cultura, consiga
contagiar ao menos alguns, só não dá para desistir.
Ah, quanto aos
parênteses, voltaremos a eles em outra prosa.
Bom trabalho,
bom estudo, paz e bem!
Sônia Gabriel