(Jornal de Caçapava, 28 de setembro de 2012.)
Nos períodos de eleições a palavra usada, pelos candidatos, sem nenhum constrangimento, sem nenhum pudor, sem nenhum respeito por nossa inteligência, se mortifica entre a ferramenta e a arma. Manifestar-se é um direito também do eleitor e, em vista dos absurdos que nosso cérebro é obrigado a suportar no horário eleitoral gratuito (apenas para eles), quase um dever.
Tenho escutado de tudo. Não vale a tinta citar, repetir o que poderia nem ter escapado de línguas sem piedade de nossos tímpanos, mas tenho também considerado as novas possibilidades. Sim, que possamos ao menos ouvir o novo, na impossibilidade de novas palavras e ideias, que sejam novas as motivações. Em política, tradição nem sempre é o melhor.
Diante de tantos discursos inflamados e alguns necessários, principalmente por parte dos eleitores, teço minhas considerações. Talvez não tão passionais como sugira o momento, mas considero-as pertinentes.
Política deve ser discutida sempre e os políticos, também. Quem opta pela função (que no atual contexto torna-se profissão) está se colocando no foco dos debates. A função é pública, remunerada com dinheiro público, logo pode e deve ser discutida publicamente. Quem a executa deveria ter avaliado constantemente seu desempenho. Tais ações e reflexões precisam ser ensinadas no cotidiano familiar e escolar.
A cada dois anos, verifico ânimos se exaltarem nos debates, as escolas encherem paredes e mesas com trabalhos sobre a história dos partidos, dos políticos mais famosos, da evolução das urnas de votação... E passa. Esperam-se mais dois anos para voltar ao assunto.
Confesso que estou cansada desse “oba-oba” das ações de ocasião. Existe uma responsabilidade no ofício de educar que é não permitir que antolhos nos sejam implantados, tentar, ao menos, semear colírio de reflexão. Não é fácil, sei, enfrenta-se muito nas salas de aula, mas temos uma ferramenta extremamente relevante: o conhecimento. O cansaço, o desrespeito, o sucateamento da profissão de professor, permitido pelo sistema, só ajuda a manter no poder quem dele deveria estar ausente.
É no cotidiano escolar que podemos realmente formar cidadãos políticos, fortalecer a reflexão de que cumprimos deveres e exigimos direitos, inclusive o direito de não termos nossa educação prejudicada com elementos tão banais. Exigir os investimentos essenciais na decente remuneração do professor para que ele se especialize realmente; para que a classe profissional possa frequentar bons teatros; para que o educador possa ler à sua escolha e não apenas as obras selecionadas, estrategicamente, para sua formação; para que o cidadão viaje, conheça outras ações, verdades, culturas. Remuneração digna de quem estudou e estudará por toda a vida.
Mas como imaginar, dentre nossos políticos, homens e mulheres conscientes desta necessidade? Como conceber uma política pública que se volte para a formação de cidadãos realmente alfabetizados, detentores de conhecimentos e práticas reflexivas, exercendo conscientemente seus deveres e direitos na sociedade? Sabendo lutar pelas necessidades coletivas, sabendo ouvir, escolher, votar e fiscalizar?
Parece improvável demais? Pode até ser, mas há anos é o que tenho feito. A cada aula, a cada nova matéria, a cada novo projeto, tento que se apropriem da condição de cidadãos, tento plantar sonhos (pois não há crescimento sem eles), tento que se atentem para o fato de que não podemos ser apenas um número, apenas mais um nas filas, apenas mais um eleitor.
Sônia Gabriel