(Jornal Vale Mais, 16 de abril de 2011.)
Há alguns anos, me deparei com um dilema educacional que me exigiu uma tomada de decisão. Estava lecionando História Regional para um curso técnico em Turismo e percebi que meus alunos precisavam de coisas muito mais práticas para seu cotidiano de trabalho. Eles reclamavam comigo que nem todos os turistas se encantavam com a História do Vale do Paraíba, mas se fascinavam com as histórias e curiosidades das cidades. Poderia ter dado continuidade ao que me foi proposto pedagogicamente, mas me inquietei com a necessidade deles. Comecei a coletar nos livros algumas pérolas para que os turistas fossem distraídos. A pesquisa me colocou diante de outro desafio: nem todas as cidades tinham livros sobre suas lendas, casos e curiosidades. Passei a coletar dados na internet, mas também não foi o suficiente.
Num final de semana, convidei minha família para irmos até algumas cidades do Vale Histórico. Fui direto para bibliotecas, mas ainda faltava, resolvi arregaçar as mangas e me entregar para outras fontes. Foi uma das melhores decisões que tomei na vida. A partir dali, foram inúmeras viagens pelo Vale do Paraíba, mais de trinta cidades visitadas, amigos feitos para toda uma vida. Passei por muitas praças, mercados municipais, casas de cultura, museus, igrejas, cemitérios, moradas de gente boa de prosa. Gente que guarda na memória as histórias que, talvez, nunca consigamos encontrar nos livros.
Essa viagem pelo Vale do Paraíba levou-me ao encontro com o Moço Bonito (Rio Paraíba do Sul) e todo um mundo misterioso que se esconde a cada vinte e cinco quilômetros.
Nunca mais deixei de caminhar pelo Vale, de visitar os mistérios das esquinas, das capelas, das alcovas chorosas das fazendas centenárias. Ainda percorro as comidas, as crendices, os santos, as senzalas, as farmácias, os empórios, as expressões e cantorias dessa gente que me acolheu de braços escancarados e com a mesa posta de café, bolo e doce-de-leite, como os de Dona Alcina de seu José Magalhães.
Devo ao Vale do Paraíba uma nova visão da vida, das pessoas; o aprendizado, que se constrói em mim, de valorização das manifestações culturais populares e de crescimento humano. Agradeço os momentos de descontraída e simples prosa, regadas com sabedoria, tristezas e alegrias, como é a passagem de cada um de nós por esta vida.
O livro ‘Mistérios do Vale’ nasceu para ser singelo, nesta segunda edição ampliada está mais amadurecido, mas não perde essa essência. São páginas para serem curtidas em família, com os amigos, sem pretensão nenhuma a não ser fazer o tempo passar lívido, bem gostoso como tarde de chuva fina em que nos servem café quente.
Sônia Gabriel
Um comentário:
Sônia, muito legal o relato da tua trajetória "garimpando" histórias e lendas diretamente na fonte! Depois que meu trabalho de pintura tomou o rumo das artes naif's, tenho sentido a necessidade de fazer o mesmo, mas no meu caso, garimpar imagens para referência! Obrigada por partilhar tudo isso conosco!
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