terça-feira, 30 de julho de 2019

Crônica - A (nossa) escola





Nesses dias de retorno às aulas, pergunto aos companheiros da minha geração dos quarentões, como era quando vocês eram estudantes ou alunos (é, há diferença)? As primeiras  respostas provavelmente serão carregadas de saudosismo, elas nos chegarão com a névoa do tempo passado, suavizadas por nossa memória seletiva e celebraremos os sucessos de aprendizagem, nossas disciplinas prediletas, os bons professores, os colegas mais próximos, os perfumes da merenda e dos livros novos, a euforia do recreio (interessante como passou a chamar-se intervalo), a belezura dos uniformes, o chegar das férias, a ansiedade dos retornos aos bancos escolares a cada novo período letivo.
Ecoarão relatos de que éramos excelentes alunos, obedientes, disciplinados, respeitávamos nossos professores e os funcionários da escola, não faltávamos, nosso material era impecável, prestávamos atenção em todas as aulas, sentávamos todos na parte da frente da sala (?????), não deixávamos de entregar as tarefas e os trabalhos solicitados, nossas notas eram  excelentes e, mesmo quando a matéria era difícil, nossa disciplina nos estudos nos faziam alcançar as melhores médias.
A nossa escola era muito diferente desta de hoje, não havia violência, os alunos aprendiam e quando algum aluno não se encaixava nesse modelo descrito, era convidado a se retirar da instituição de ensino.  As salas não eram superlotadas, ninguém ia para a aula sem material e não faltavam em dia de avaliação.
Chego a sonhar com a invenção da máquina do tempo e voltar para ser professora nessa época, o problema seria localizar o tempo para a chegada do equipamento, pois essa escola sem problemas, quase perfeita, nunca existiu. Basta visitar a História da Educação, a história dos professores e alunos brasileiros. Aparando as arestas do “nunca existiu”, obviamente muitas dessas referências eram fatos e outras não, em distintas memórias. A escola das nossas memórias é só nossa, é afetiva.
Mas a escola in veritas sempre teve muitas questões e essa afirmação recorrente de que ela  foi melhor do que a de agora é discutível, carece de informações e reflexões profundas  como qualquer construção de conhecimento. Não é tarefa para uma singela crônica.
Pois é, a crônica! O que me trouxe a estas linhas foi considerar que a escola, em geral, para muitos alunos, é chata. Ficar ao menos cinco horas por dia em um local fechado, sentado em cadeiras duras, num entra e sai de professores em que muitas disciplinas não são do gosto para crianças e adolescentes, pedindo atenção e concentração quando o celular é bem mais divertido (já foram a rua, o radinho, o videogame, a televisão...), escutando coisas que não se sabe para que servem ou tendo que  “saber sobre o tempo em que nem tinha nascido” não é tão simples.
Eu não estou justificando indisciplinas graves nem violências, antes que a tentação de tornar rasa essa prosa nos engula. Estou pensando na maioria dos nossos alunos, no comportamento que observamos no cotidiano escolar, na necessidade constante de ir ao banheiro que eles desenvolvem da primeira à sexta aula. E, para tentar entender pensei em mim.
Pois bem, eu não fui a melhor aluna da sala,  não aprendia tudo num estalo, não fui uma aluna brilhante,  não tive apenas notas altas. Era muito caprichosa e dedicada, isso sim. Adorava ir à escola no primário; sofri no ginásio, pois tive que trabalhar para ajudar em casa; detestei o colegial e me encontrei no magistério. Aprender a estudar mesmo foi algo que se concretizou na faculdade e o encantamento foi tanto que nunca mais parei de fazê-lo.
É como se entre o despertar do primário e as descobertas do conhecimento na  universidade, existisse um abismo que é abrandado pelas lembranças de poucos professores que solicitam respeito da minha memória; no entanto,  muitos nomes sequer lembro, não recordo a maioria dos conteúdos. Devido minha aptidão para humanas, as disciplinas que me marcaram foram Arte e Língua Portuguesa.
Não conseguiria compreender as Ciências Humanas sem a instrumentalização da Literatura, da escrita e da Arte. É certo, para mim, que são ferramentas para todos os demais aprendizados escolares. Essas pérolas suavizam qualquer esforço exigido seja de Humanas, Biológicas ou Exatas. São saberes que nos humanizam, nos ajudam a caminhar pela dolorosa e prazerosa descoberta do eu que nos motiva a continuar acreditando no ser humano, conscientes de que enquanto professores somos eternos estudantes; sem realizar isso em nossas reflexões fica impossível entrar nas salas de aulas com as demandas que tem nos exigido.
Nessa volta aos dias letivos, torço para que as aulas de História (meu lugar de fala) que eles acham tão chatas possam ser mais agradáveis e que eu consiga ajudá-los a olhar para nosso passado de forma atenta o que tem sido muito necessário. Tomara que minha paixão pela história das pessoas, pela nossa cultura, consiga contagiar ao menos alguns, só não dá para desistir.
Ah, quanto aos parênteses, voltaremos a eles em outra prosa.
Bom trabalho, bom estudo, paz e bem!

 Sônia Gabriel



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