terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Coluna Crônicas do Jornal Valeparaibano - Crônica para meu filho




(Em 28/05/2003)

Tinha sentido tanta dor que imaginava ter morrido, aquele alívio estava tão bom que nem me mexia. Em toda aquela escuridão, ouvi uma voz me chamando. “abra o olho, coragem mulher, abra o olho e veja seu filho”. Não queria abrir, estava tão gostoso não sentir dor alguma, um cansaço me dominava, então escutei, ele chorava, um choro forte, de emergência.
Quando o vi, não sei o que senti, estava sujo, de cabeça para baixo, gritando, era tão pequeno que parecia que não poderia sobreviver. Colocaram-no sobre meu corpo e eu tinha medo de abraçá-lo e quebrá-lo. Tremíamos de frio naquele junho de 1998. Ficamos a manhã toda encostadinhos um no outro, eu contei para ele que no dia em que soube estar grávida quase bati o carro, cortei o dedo quando tentava abrir um litro de leite e cai, literalmente, de bunda no chão. Tudo isso num único dia, o pai desesperado, chegou a pensa que eu não sobreviveria.

Estava tão longe de tudo, tão acima do mundo real, que não pensei no quanto engordaria, nos enjôos que sentiria nas roupas que não me caberiam mais, na dor que quase me enlouqueceria, mas tudo isso também chegou, e eu estava lá, de alma renovada, cheia de esperança, comovida com o mundo e com toda a sua criação... Tudo era capaz de me fazer chorar, o tempo parecia não passar, e nem as ultra-sonografias eram capazes de me aquietar.

Queria vê-lo, passava horas cuidando do quartinho, das roupas, tentando imaginar como seria, com quem se pareceria, como o chamaria, como seria sua voz e o que falaria primeiro, que iria ser quando crescesse ... E ele já estava lá comigo, e eu falava sem parar, como se ele pudesse me entender, nem os olhos ainda abria, mas eu já lhe dizia que o amaria para sempre, e que ele nem imaginava o privilégio que tinha tido, pois eu seria a melhor mãe do mundo, e que ele nunca se arrependeria de ser o meu filho.



Feminino esperar

Você nem existe ainda
E eu tenho certeza do bem que me fará
Que cruel destino
Quero lhe impor meu pequenino
O de me fazer o que ninguém conseguiu,
Nem mesma eu,
Que tarefa árdua
Trazer paz ao meu inquieto coração!
Quando olho no torto olhar
De seu ansioso progenitor
Tenho a súbita esperança
De uma completa felicidade.
Você nem existe ainda
E eu sei o bem que me fará...
O homem que tenho diante dos meus olhos precisa continuar.

Sônia Gabriel


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