quarta-feira, 4 de maio de 2016

Coluna Crônica Jornal de Caçapava: Solidão capitalista.



(Jornal de Caçapava, 11 de setembro de 2015.)

O que mais me incomoda no quesito solidão não é nem mesmo senti-la, mas a obcessão dessa sociedade individualista dita intelectualizada em querer nos empurrá-la goela abaixo. Cheguei à conclusão que ou não posso almejar essa intelectualidade ou sou emocionalmente frágil, dependente da presença humana de forma extremada, pois não consigo apreciar a solidão no sentido estrito do conceito.
Não faço o gênero coque, cigarro, janela entreaberta para que a fumaça não escape de todo e o barulho sinalizando outras vidas não entre de todo, perturbações para meus escritos e reflexões. Enfim, estou mais para o avental, volante, cadernetas de vacinação e chamada, bloco de anotações, giz e bons ouvidos para conseguir matéria-prima. Preciso conviver, não acho graça nas minhas opiniões sempre tão condescendentes comigo. Necessito do olhar do outro, bom ou não, positivo ou não, de generosa humanidade ou não, mas externa ao meu modo de ver e viver o mundo.
Alguém me disse que a solidão é necessária... Sinal de maturidade...  Urge absorver melhor... Entender esse conceito...
Mas voltando à imposição da solidão, por hora, entendo que o mercado precisa de mais gente só, mais moradias dormitórios, mais utensílios eletrodomésticos para uso individual, mais carros para um passageiro apenas, mais gente necessitando de remédios e cuidadores, mais pratos congelados individuais, mais redes sociais para não ficar tão evidente algum aspecto negativo da presença da mesma... Como a solidão pode ser lucrativa! Sem responsabilidades com família, sem filhos podemos obter mais bens materiais, investir mais em nós mesmos, cuidar mais das nossas necessidades e acumularmos mais do tudo que nosso dinheiro tão só nosso pode conquistar. Mais filhos, mais gastos, menos tempo para nós do nosso esforço produtivo? Parece que para o mercado que se esforça tanto com propagandas, filmes, novelas para nos convencer... Sim.
Certamente alguém lucra com tanta individualidade, mas quem? Quais corporações? Quais vendedores dos antídotos para o mal que distribuem? Que parte de nós é mais feliz sendo mais solitária disfarçada de individualista? Ao menos para buscar essas respostas teremos que conversar, não é mesmo?

Sônia Gabriel




Nenhum comentário: