domingo, 22 de março de 2015

Coluna Crônica Jornal de Caçapava: O Irmão do Filho Pródigo.



(Jornal de Caçapava, 13 de fevereiro de 2015.)



É muito conhecida a parábola do Filho Pródigo em que Jesus ensina aos seus ouvintes, como era seu costume, a perdoar e o valor da reconciliação verdadeira. É uma parábola muito bonita, mas eu tenho o meu pecado: sinto pena do irmão do Filho Pródigo, sempre tive.
Desde a primeira vez que escutei essa história, me comovi pela aparente solidão desse irmão. Não, eu não estou questionando a parábola, nem o autor, que Mestre, chegava ao coração dos seus ouvintes humildes e seguidores pela simplicidade das palavras, daquilo que lhes era comum. Que seria de nós sem a vivência do perdão e da reconciliação? Como é importante sentirmos que maior que nossos erros devem ser: a força do nosso arrependimento, a nossa vontade de reconstruir nossa história e desejar profundamente a reconstrução da história do próximo.
Sim, sinto uma comoção pelo irmão do Filho Pródigo. Retirando toda a pedagogia dessa parábola, esquecendo que esse pai é o Senhor e que o Filho Pródigo representa cada um de nós que, mesmo com os erros cometidos, pode retornar e se arrepender sinceramente, e , recomeçar... Pensando apenas em nossa frágil humanidade em aprendizado, lamento pelo irmão que fica. O irmão que julgamos invejoso da atenção que o pai dá ao que retorna caído.
Mas esse irmão não tem um papel profundamente solitário? Que pai é esse que não conhece seu filho que fica? Não percebe que apesar de ele estar presente, trabalhando, obedecendo, não se sente pertencente, não se sente dono a ponto de não pedir o banquete e convidar os amigos para celebrar? Estou falando de nós. Nós que muitas vezes nos ocupamos de cuidar dos filhos com os quais nos preocupamos mais. Parece óbvio para os pais que assim seja, mas será que é bom achar que os bons filhos sabem? Que por serem bons não precisam das palavras que evidenciem isso? Será que não é preciso deixar claro que eles, os filhos que não precisam do nosso perdão, da nossa angustiada preocupação, também são tão amados?
Existem pessoas que são mais zelosas com familiares e amigos que necessitam da sua ajuda, não conseguem ser atentas, amigas daqueles que não necessitam delas. É curioso, conheço muitas pessoas assim, é quase patológico. Parece-me que diante da desgraça, fragilidade, doença, preocupação do outro, elas se agigantam, são mais importantes. Conheço alguns pais que também se comportam assim. Assusta-me esse tipo de amizade e paternidade. É preciso atenção para distinguir o amor que nos acode nas necessidades do amor que precisa das nossas necessidades.
Se o pecado do Filho Pródigo foi a vida desregrada e o perdão do seu pai a cura por seu arrependimento, não será o pecado desse irmão apenas fruto da sua solidão? Na parábola o pai amoroso os traz, os dois, para si. Nós, mortais, podemos ser mais atentos também com os filhos que ficam...

Sônia Gabriel


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